Virgílio Vieira Tebas

«Pasmo sempre quando acabo qualquer coisa. (...) O meu instinto de perfeição deveria inibir-me de acabar; deveria inibir-me até de dar começo. Mas distraio-me e faço.» (O livro do desassossego, 152)

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« Virgílio Vieira Tebas é, até prova em contrário, o maior - senão mesmo o único - escritor falhado do século XXI em Portugal. Nasceu algures no tempo e no espaço... Está vivo actualmente (ou assim o parecia da última vez que foi visto), não se sabe bem onde. Criador da cantiga de inimigo, é também dono de um currículo inqualificavelmente extenso... Consta que teve de pagar (muito) para ver os primeiros textos publicados. Concorreu recentemente a um prémio literário, tendo conseguido não só não ganhar mas também ser classificado como "a pior proposta literária" (com direito a confiscação e destruição de bens pela polícia secreta). Mantém um 'blog' - com o título curioso de "Virgílio Vieira Tebas" - ao qual, carinhosamente, se refere como "vlog". » em revista Big Ode #4 (http://big-ode.blogspot.com)

Monday, December 18, 2006

come plu HA diviC

P. (surge sem aviso): O que fazias antes de conheceres isso? R. (surpreendido mas não muito): Não sei, não me lembro...
P.: E depois, fazes algo mais? R.: Não sei, só me lembro do vazio e das trevas.
P.: Ah… Percebo. Mas sentes-te preenchido…? R.: …Acho que não. Durante não sinto, antes sinto-me anexo e depois sinto-me… vazio.
P.: Tens frio? R.: Eu disse “vazio”.
P.: Eu sei; e eu perguntei se tens frio. R.: Porquê?
P.: Isso é uma pergunta? R.: Eu sim, tu é que não.
P.: Não percebi. R.: O que eu perguntei precisa de resposta, o que tu perguntaste não.
P.: Ah… Onde estávamos? (…) R.: Temos estado sempre aqui.
P.: Não falo disso. Em que parte da conversa estávamos? R.: Fazes muitas perguntas. Não querias saber se tenho frio? Os papéis invertem-se.
P.: Eu sei. R.: Sabes o quê? Se eu tenho frio?
P.: Não, que os papéis se invertem. R.: (…)
P.: Eu recupero sempre. Tens frio ou não? R.: Agora não, porquê?
P.: Outra pergunta? O frio é uma característica. R.: Pois sim… Quem és tu afinal?
P.: Os papéis invertem-se. R.: Eu sei, fui eu que o disse.
P.: Não é verdade, tu apenas respondeste. R.: E então?
P.: Isso é uma pergunta? Não devias fazer perguntas. R.: Essa também não precisa de resposta. E acho que não devias afirmar.
P.: Afirmar o quê? R.: Esquece. Lembra-te do início.
P.: Qual início? R.: Pareces perdido. Como é que começámos?
P.: Não sei, não me lembro. R.: Eu sim, mas não interessa, estou a sentir-me bem.
P.: “Bem”? Explica-te. R.: Há orientação aqui.
P.: Não acho. R.: Pois eu sim.
P.: Volta para de onde vieste. R.: Não percebi.
P.: O quê? R.: Não percebi o que disseste.
P.: Eu disse que a volta do mar é uma onda terrestre... R.: Acho que não.
P.: Achas que não é? R.: Acho que não foi isso que disseste.
P.: Então? R.: Então, o quê?
P.: O que disse eu? Já não me lembro. R.: Não interessa, tu é que apareceste aqui!
P.: Como? R.: “COMO”, O QUÊ?!
P.: HA! Onde está agora? R.: …Onde está o quê?
P.: Tu sabes. Bem, vou-me embora. R.: Bem me parecia.
P.: O quê? R.: Estrelas virtuais... Agora vai.
P.: Sim. E tu volta ao que estavas a fazer. R.: Que era…?
P.: Tu é que devias saber. (sai sem pedir licença)
R. (já sozinho): Mas não sei. Não consigo lembrar-me. Acho que não existia.